19/11 - 北京

Há as sete maravilhas do mundo, mas duas já me bastariam, a Ana Paula Arósio, claro, e hoje fui conhecer a outra, a grande muralha da China. Viagenzinha que parecia arriscada de fazer por conta própria. Acertaríamos chegar até lá, a uns 70 km de Pequim? Conseguiríamos comprar os ingressos lá na boca do gol, ou estaria tudo esgotado, como dizia a internet que estava a Cidade Proibida?
Ao comprar a passagem de ida de trem, a mocinha disse que as de volta estavam todas já vendidas até às 8 da noite. Pior ainda, iríamos até lá no cu asiático do mundo só pra passar o dia ilhados do lado de fora?  No final, deu tudo certo, com ingressos disponíveis na hora e a volta em ônibus. 
Há bastantes banheiros públicos e gratuitos também na China, mas aqui o esquema com eles é outro: deve-se escanear com o celular um código num aparelho preso na parede, para  que ele libere o papel higiênico. E como explicar pro senhorzinho chinês zelador do banheiro que nem conexão com a internet eu tinha? Provavelmente ele entendeu a linguagem universal daquele punzinho anunciando que coisa mais substanciosa estava a caminho, e me ofereceu, do próprio bolso, três humildes picotinhos de papel, bastantes para aquela primeira abordagem, mas não suficientes para, como dizer?, fazer a sintonia fina...
Já na saída do trem, e depois dentro de toda a muralha, incomensuráveis cardumes de chineses se acotovelando para andar de lá pra cá e de cá pra lá, realmente não tem nada muito além disto para fazer naquele local. Eventualmente, um dos tiozinhos na aglomeração puxava um catarro lá do fundo da própria alma e dava aquela escarrada no chão, sem qualquer cerimônia. É verdade o que diz a lenda, as catarradas são uma realidade na China. E nem havia muito chão livre naquela superlotação humana, então nossas pernas corriam perigo.
Pouquíssimos ocidentais no local. Em horas passadas lá dentro, contei uma meia dúzia. No que imaginei ser um dos grandes destinos turísticos de quem se aventura a viajar mais longe do que até a praia do Boqueirão.
Na muralha, mais uma vez, aconteceu, agora ostensivamente, o que algumas outras vezes desde a chegada à China tem me ocorrido: Mocinhas jovens olhando para mim, me dirigindo sorrisos de longe, as de hoje nem tão de longe, e ainda dizendo efusivos "hello"... Sim, eu sei, a mulherada sempre gravitou mesmerizada ao meu redor, como moscas inevitavelmente sobrevoam uma bola de esterco. Deve ser algum ferormônio exalado pelo meu sovaco. Ainda que, depois da ida ao banheiro algumas horas antes, com acesso a três míseros picotinhos de papel, mais provável é que o aroma estivesse vindo de outro lugar. Mas o que será isto? Absoluta falta de familiaridade com feições ocidentais? É um mundo globalizado... Será minha barba, quando por aqui ninguém as usa, e acho que nem mesmo as tem? Ou simplesmente a irresistibilidade de meu magnetismo animal, ao qual apenas a Ana Paula Arósio parece ser imune?
À tarde, visita à Praça da Paz Celestial, palco do evento em que um protestante, mesmo não sendo um personagem de desenho animado, foi atropelado por um tanque do exército, umas décadas atrás. O clima é asfixiante, com mais pontos de checagem de documentação, não apenas mas mais detidamente dos não-residentes, do que devia ser praxe no Checkpoint Charlie ou na fronteira da faixa de Gaza. Barricadas a cada quarteirão, todo mundo passando por cercadinhos e escaneando documentos, e este é o dia-a-dia dos pequineses, que tratam este grau de vigilância e controle com naturalidade. Mesmo que, com aquele semblante fechado e a aspereza dada pela falta de um mínimo de inglês , os policiais não sejam ostensivamente intimidadores ou desrespeitosos, e que boa parte deles, principalmente os mais jovens, façam o procedimento com um sorriso amigável, aquilo vai te oprimindo, causando um desconforto meio fóbico, a dúvida sobre o que está fazendo aqui, e não no Canadá. Sempre há um policial por perto, e que já começa a se aproximar de você ao mais insignificante sinal de algo indesejável sendo feito.
Quando na Praça Vermelha, não vi o presunto de Lenin, o mausoléu estava fechado nem lembro por que motivo. Hoje, em Tian'anmen, não vi o presunto de Mao, que volta para o freezer todo dia depois das 11.
Depois, à noite, visita à vila olímpica, com aquele estádio tão famoso quanto atualmente abandonado, como tantos no Brasil também, e um jantar no buffet do hotel que foi a primeira coisa desapontadora nele. Não tão caro assim, mas com pouca variedade de comida, meio morna, e só umas porcarias de frutas de sobremesa.

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